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Bebida alcoólica afeta o ganho de massa muscular: mito ou verdade?
Bebida alcoólica e ganho de massa: será que existe uma relação negativa entre elas?
04 Julho 2018
Bebida alcoólica afeta o ganho de massa muscular: mito ou verdade?

Na atualidade, com a expansão das redes sociais e blogs fitness, a buscar por um corpo perfeito está cada vez mais em alta, e, assim, aumenta a cada dia o número de pessoas que busca por músculos torneados, principalmente entre os jovens.

Na contramão, os hábitos alimentares de muitos brasileiros, ainda vêm se mostrando distantes do que a Organização Mundial de Saúde (OMS) e Guias Alimentares propõe como saudável.

Por diversas vezes as pessoas até mantêm a linha na alimentação durante a semana, mas aos finais de semana saem das regras. Como se diz por aí, “chutam o balde” no encontro com os amigos e cometem abusos na ingestão de alimentos e de bebidas alcoólicas.

A má alimentação até é conhecida por interferir negativamente no ganho muscular, mas será que o consumo consciente de algumas doses de álcool afeta o desempenho e o ganho de massa?

O consumo de bebidas alcoólicas

o consumo de bebidas alcoólicas

O consumo de álcool per capita no Brasil aumentou mais de 40% nos últimos anos, tornando o país um dos líderes no ranking.

A OMS não vê o consumo do álcool em si como um problema, mas considera que o uso excessivo e a falta de controle em certas situações podem se transformar em ameaças para a saúde.

Doses seguras para pessoas saudáveis estão abaixo de 30g de etanol por dia, o que equivale a duas latas de cerveja ou duas doses de destilado, como uísque ou pinga, e, de preferência, não diariamente. Essa quantidade normalmente não prejudica a saúde do fígado ou do coração.

É claro que o seu consumo não deve ser estimulado, todavia, caso o indivíduo opte por beber, que seja dentro dos limites, independente se esse consumo é pontual ou habitual.

Existe uma real relação entre bebida alcoólica e ganho de massa?

Quando o assunto é bebida alcoólica e ganho de massa, uma das maiores polêmicas está nos seus efeitos na performance e, consequentemente, na distribuição corporal.

A resposta é bem relativa, uma vez que os efeitos do álcool no organismo e na hipertrofia vão depender de diversas circunstâncias como: dose ingerida, freqüência de consumo, tempo entre ingestão e atividade física, metabolismo do indivíduo e composição corporal.

Apesar da maioria das pessoas acreditar que o etanol produz apenas efeitos prejudiciais, estudos apontam a não-interferência de seu consumo, quando leve ou moderado, em algumas circunstâncias. Vamos discutir mais detalhadamente as doses e reações no organismo.

Os efeitos imediatos

Há um consenso de que o álcool é um depressor do sistema nervoso central e que desencadeia sinais como rubor na face e alterações de atenção, entre outros. Seu consumo tem um efeito deletério em uma infinidade de sistemas dentro do corpo.

Há décadas, o American College of Sports Medicine (ACSM) já se posicionou quanto ao uso de álcool em esportes, afirmando que a ingestão aguda de álcool pode exercer efeito prejudicial em grande variedade de habilidades psicomotoras, mesmo em pequenas doses.

Entre elas estão: retardo da resposta reativa, equilíbrio do corpo, estabilidade, precisão e coordenação complexa. Os tempos de reação podem ficar até 30% mais lentos.

O consumo de bebidas alcoólicas pode ser prejudicial caso o praticante de atividade física o faça no dia de treino, uma vez que teria menor destreza para a prática do exercício após a ingestão.

O organismo demora cerca de uma hora e meia a duas horas para eliminar os efeitos dos 30 gramas de álcool, aquelas 2 latas de cerveja. Caso a dose seja maior, vai aumentando-se o tempo necessário para metabolização.

Portanto, a prática de atividade física não é indicada após o consumo de bebidas, sendo necessário aguardar o período de eliminação do álcool. Além do mais, se o consumo se tornar crônico, com certeza irá atrapalhar no ritmo de treinos e interferir no ganho de massa magra.

Os efeitos tardios

os efeitos tardios

Em estudos realizados na Escócia em 1987, indivíduos que foram submetidos a doses de álcool, não tiveram prejuízos em testes psicomotores horas após a ingestão, apesar de terem apresentado mudanças nas respostas das tarefas de atenção em baixas doses.

Curiosamente, os testes subjetivos pareciam ser mais sensíveis aos efeitos do álcool no sistema nervoso central durante o período da “ressaca”, algumas horas depois, quando a concentração de álcool no plasma já era baixa e os sujeitos sentiam-se atordoados.

Esse é um alerta para atletas, que muitas vezes deixam de ingerir bebidas no dia do evento esportivo ou competição, entretanto, consomem álcool na noite que antecede a atividade.

Já em outro estudo realizado em 1998, percebeu-se que a ingestão de até 100ml de álcool tinha pequeno efeito na performance psicomotora na manhã seguinte. Contudo, houveram mudanças em relação à percepção e à qualidade do sono.

O mecanismo pelos quais a bebida alcoólica afeta o ganho de massa magra

O etanol e seus produtos metabólicos secundários, como o acetaldeído, afetam diretamente a síntese de proteínas no tecido muscular esquelético, especialmente nas fibras musculares do tipo II, as as que mais respondem à hipertrofia.

Em pesquisas, uma diminuição de 15 a 20% na síntese proteica no músculo esquelético foi observada no músculo esquelético após 24 horas de intoxicação com etanol.

Ainda são inconclusivos os mecanismos pelos quais o álcool prejudica o músculo esquelético, mas o que se compreender bem é que sintomas como cãibras musculares, dor e perda de propriocepção são comuns quando há o consumo abusivo.

Bebida alcoólica e ganho de massa: a desidratação e a termorregulação

bebida alcoólica e ganho de massa a desidratação e a termorregulação

O álcool é um potente diurético, sendo que, para cada grama de etanol consumida, há um aumento de 10 ml na produção de urina.

Isso faz com que as pessoas sintam necessidade de urinar mais e, se não ingerir água, desidratem.

Ele também age como um vasodilatador periférico, aumentando a perda de líquido por evaporação, o que piora a desidratação.

Essa ação teria mais interferência na termorregulação e não na massa magra, se não fossem as alterações nos treinos causadas pela sensação de desidratação.

Um corpo desidratado pode apresentar tonturas e muita sede, o que impede que o exercício físico seja feito em sua plenitude.

Seu consumo também pode prejudicar a regulação da temperatura corporal durante o exercício prolongado, principalmente em ambientes frios.

Essa reação pode diminuir a força aplicada no exercício, resistência muscular, velocidade e resistência cardiovascular.

Bebida alcoólica e ganho de massa: alterações no metabolismo

O relatório da ACSM estabelece que a ingestão aguda de álcool não necessariamente influencia as funções metabólicas ou fisiológicas essenciais para as performances físicas, a depender das doses ingeridas.

Em estudos realizados comparando indivíduos que fizeram uso de pequenas e moderadas doses de álcool com aqueles que não o fizeram, não houveram alterações notáveis no metabolismo energético, nos batimentos cardíacos, rendimento cardíaco, pressão sanguínea, ventilação, fluxo sanguíneo muscular, consumo máximo de oxigênio (VO2 máx) e respiração.

Já em altas doses, o álcool é capaz de alterar a fisiologia de todo o organismo, provocando um distúrbio da homeostase.

Bebida alcoólica e ganho de massa: a influência nas horas de sono

bebida alcoólica e ganho de massa a influência nas horas de sono

Em um estudo realizado em 2015 pela School of Sport & Exercise da Nova Zelândia com jogadores de rubby, o qual avaliou o efeito do uso pesado episódico, foi vista uma diminuição significativa nas horas de sono, com os participantes relatando de 1 a 3 horas de descanso durante a noite após a bebedeira.

Alguns autores observaram uma perda na profundidade do sono com um menor tempo de sono REM e um aumento no sono no estágio 1.

O uso intenso de álcool episódico e as reduzidas horas de sono associadas, não resultam em prejuízo de desempenho anaeróbico na manhã seguinte, contudo, a recuperação total deste comportamento é alcançada em 2 dias após o episódio.

Portanto altas doses de álcool e uma noite mal dormida podem prejudicar a rotina de treino nos dias posteriores, o que acarretaria em provável menor nível de atividade física e piores resultados na hipertrofia.

Bebida alcoólica e ganho de massa: os estoques de glicose

Você já deve ter ouvido falar em alguém que bebeu e precisou de glicose. A hipoglicemia induzida por altas doses de álcool é um efeito indesejável e pode ser explicada por um prejuízo na gliconeogênese hepática (produção de glicose pelo fígado) e o subsequente débito de glicose.

Outro fator é o superestímulo à produção de insulina com altas doses de bebidas, ricas em carboidratos.

Também há a diminuição da captação de precursores gliconeogênicos, lactato e glicerol, e, portanto, redução da captação e armazenamento de glicogênio muscular, o que prejudica a síntese proteica durante a recuperação muscular.

Bebida alcoólica e ganho de massa: desempenho e rendimento

bebida alcoólica e ganho de massa desempenho e rendimento

Visto os numerosos e complexos mecanismos pelos quais o etanol impacta os sistemas fisiológicos, pode-se supor fortemente que concentrações elevadas de álcool no sangue no momento do exercício prejudicam o desempenho.

Existem relativamente poucos ensaios clínicos que abordam essa questão, devido a questões ética que envolvem a intoxicação por etanol em pesquisas científicas.

Por mais que o consumo de bebidas reduza a ansiedade, a percepção de esforço e aumente o prazer da atividade física, dependendo da dose pode haver um aumento do desgaste corporal durante o exercício.

Uma pesquisa realizada com jogadores de rugby irlandeses, mostraram que a “ressaca” tem efeito negativo significante na performance aeróbia dos jogadores, com queda de 11,4%, no rendimento dos atletas após eles beberem suas quantidades habituais. Já as condições anaeróbias não foram alteradas pelo álcool.

Os resultados de um estudo publicado pelo Institute of Food, Nutrition, and Human Health em 2010, indicam que o consumo de quantidades moderadas (1g de álcool por kg de peso corporal) após exercícios excêntricos aumenta as perdas normalmente observadas na força dinâmica e estática, tendo o desempenho reduzido pela metado.

Essa fraqueza parece ser devido a uma interação entre dano muscular e álcool, em vez dos efeitos sistêmicos do consumo agudo de álcool. Doses menores do que 0,5g/ kg parecem não afetar o desempenho e não ter efeito sobre a perda de força.

Já em atividades aeróbicas como corridas, baixas dosagens de álcool parecem não afetar os tempos dos atletas, bem como não alterar significantemente os batimentos cardíacos durante a corrida. Doses maiores já se mostram prejudiciais para esse desempenho.

Embora estas pesquisas forneçam novas ideias sobre o efeito do consumo de álcool no músculo pós-exercício, mais pesquisas são necessárias para verificar como essa relação existe e estabelecer os mecanismos fisiológicos que governam essa resposta.

Há ainda o risco de lesão entre atletas de competição, ainda que o consumo de álcool ocorra entre 24 horas e 12 horas antes do evento, uma vez que pode haver um efeito residual do álcool, no qual a fadiga estaria associada.

Bebida alcoólica e ganho de massa: a recuperação muscular

Para o reparo do músculo e a hipertrofia adaptativa, é necessário que ocorra a síntese proteica. A maioria dos estudos que examinam a recuperação muscular têm focado predominantemente em medidas funcionais de desempenho muscular e marcadores sanguíneos de danos no tecido celular.

Até o momento, esses estudos produziram resultados inconclusivos que não demonstram uma dependência de dose ou limiar crítico acima do qual a recuperação muscular está comprometida, mas remetem à um prejuízo na capacidade de recuperação do organismo após o término da atividade.

Marcadores de dano muscular como a creatina quinase (CK) e citocinas pró-inflamatórias não tem se mostrado bons parâmetros no consumo agudo de álcool. Entretanto, uma pesquisa revelou uma redução na taxa de síntese proteica (avaliada por fibrinogênio e albumina) em cerca de 30% nas 4 horas medidas posteriormente após ingestão alcoólica e exercício.

As alterações hormonais

Altas doses de etanol, acima de 1,5g/kg, podem suprimir a produção de testosterona em após 10-16 horas da ingestão.

Pode haver também um aumento considerável na produção de cortisol, um hormônio catabólico, devido aos efeitos estressantes do etanol, além de um efeito negativo na produção de hormônio do crescimento.A literatura ainda é inconclusiva, mas sabe-se que todas essas alterações hormonais encontradas resultam em um metabolismo que vai contra a conquista da hipertrofia muscular.

Conclusão

Bebida alcoólica e ganho de massa: tanto os efeitos do álcool na fisiologia humana quanto os parâmetros que determinam o desempenho atlético são multifatoriais e extremamente complicados.

Existe sim uma série de sintomas adversos causados ​​pela ingestão aguda de álcool, no entanto, ainda não existem dados consistentes suficientes para afirmar uma relação prejudicial entre o consumo baixo ou moderado e o desempenho físico.

Em baixas doses, aparentemente não há queda no rendimento físico após o consumo, somente no tempo de reação do organismo.

No entanto, só porque as bebidas alcoólicas parecem não ter influência negativa no desempenho, não implica em incentivar o seu consumo.

Atletas devem permanecer cautelosos em ingerir álcool, uma vez que o uso moderado não causa consequências imediatas graves para o organismo mas o uso abusivo traz diversos riscos.

Sendo assim, uma pequena dose no final de semana provavelmente não comprometeria de forma significativa os resultados do exercício, mas certamente o exagero e o consumo frequente sim.

Fonte: Geração Fit