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EXERCÍCIOS RESISTIDOS
12 Março 2018
EXERCÍCIOS RESISTIDOS

Nas últimas décadas tem ocorrido evolução importante nos conhecimentos sobre as ciências básicas do exercício físico, e também sobre a importância da atividade física em promoção de saúde, intervenção terapêutica e reabilitação. Uma necessidade atual é a integração dessas áreas do conhecimento, para que possamos utilizar os exercícios físicos da forma mais eficiente e segura, em cada situação.

Talvez as mais substanciais mudanças de conceitos resultantes da evolução do conhecimento sejam as relativas aos exercícios resistidos, também conhecidos como exercícios contra resistência, exercícios de fortalecimento muscular, exercícios com pesos, e mais popularmente, musculação. A expressão “exercício resistido” decorre da tradução do inglês “resistance” ou “resistive” – “exercise” ou “training”.

Exercício resistido pode ser definido como contrações musculares realizadas contra resistências graduáveis e progressivas. A resistência mais comum são os pesos, mas também é possível utilizar resistência hidráulica, eletromagnética, molas, elásticos e outras.



Em meados do século XX, uma noção amplamente difundida entre leigos e mesmo entre profissionais era a de que os exercícios resistidos produziam muitas lesões, diminuíam a flexibilidade e a coordenação, eram perigosos para cardiopatas, dificultavam o crescimento dos adolescentes, levavam à impotência sexual, além de serem inúteis para a promoção de saúde. Tais conceitos não tinham base em evidências, e foram sendo abandonados ao longo do tempo. A observação e o estudo dos efeitos do treinamento resistido em atletas evidenciaram a sua eficiência para aprimorar o desempenho físico e para diminuir a incidência de lesões esportivas.

Supostas consequências indesejáveis com relação à saúde nunca foram documentadas, e efeitos saudáveis foram sendo reconhecidos. Cada vez mais a eficiência em estimular a integridade e as funções do aparelho locomotor temsido demonstrada, e mais recentemente, os seus efeitos promotores de saúde cardiovascular e alto grau de segurança geral. Os estudos com pessoas idosas têm documentado a importância dos efeitos dos exercícios resistidos para melhorar a qualidade de vida por meio do alívio de dores articulares, maior independência funcional e melhora da auto‑estima. A segurança músculo‑esquelética e cardiovascular dos exercícios resistidos também tem sido demonstradas, mesmo diante de co‑morbidades.

Os exercícios resistidos podem ser mais suaves do que caminhar. Atualmente um significativo corpo de evidências justifica a utilização dos exercícios resistidos para promoção de saúde, terapêutica e reabilitação.

CONCEITOS BÁSICOS DE EXERCÍCIO RESISTIDO

Atividade física pode ser definida como contração muscular, de qualquer tipo ou intensidade, para qualquer finalidade, sempre com gasto energético. Atividade física pode ocorrer no trabalho, no lazer, no esporte, e na vida diária das pessoas.

O movimento é uma consequência frequente da atividade física, mas nem sempre a contração muscular produz movimentação das articulações. Exercício é a atividade física estruturada para atingir algum objetivo funcional ou morfológico.

Em um programa de treinamento resistido cada exercício enfatiza a ação de um grupo muscular, justificando a denominação de “exercícios localizados”. Assim sendo, embora os programas de treinamento resistido ativem todos os grupos musculares, é possível enfatizar os exercícios para as regiões anatômicas prioritárias para as necessidades individuais.

Os exercícios resistidos são habitualmente realizados com movimentação articular, portanto classificados como “isotônicos”, alternando contrações musculares concêntricas e excêntricas. Alguns tipos de aparelhos para exercícios resistidos utilizam apenas as contrações concêntricas, com menor eficiência para os efeitos do treinamento.

Contrações musculares estáticas, sem movimentação das articulações, também podem ser utilizadas em treinamento resistido. Quando ocorrem, os exercícios são chamados de “isométricos”. A sua utilização ocorre no treinamento de força máxima para atletas, com grandes cargas, e em aplicações terapêuticas com pequenas cargas, quando o movimento articular não deve ou não pode ocorrer.

Cada conjunto de movimento concêntrico e excêntrico é denominado uma “repetição”, e os exercícios são realizados em conjuntos de repetições denominados “séries”. O número de repetições por série para a maioria dos objetivos do treinamento fica entre cinco e quinze. Após a realização de uma série se segue um intervalo de descanso, geralmente entre um e dois minutos, para permitir a recuperação da capacidade contrátil dos músculos. Assim sendo, os exercícios resistidos são também classificados como “intervalados”.

Exercícios “contínuos” são aqueles em que os movimentos são realizados sem contagem das repetições, e controlados pelo tempo de atividade ou por distância, como no caso de corrida, ciclismo, natação e outros. Os exercícios contínuos também podem ser intervalados, geralmente em situações de treinamento, quando determinadas distâncias ou tempos de atividade são repetidos.

A produção energética nos exercícios resistidos na maioria das vezes é do tipo anaeróbia, sendo os exercícios denominados “anaeróbios”. Isto se deve a que as contrações musculares geralmente ocorrem com mais de 40% das fibras em ativação, acima do limiar anaeróbio, cuja correspondência em porcentual de fibras ativadas vai de 30% a 40% 22. Com esses níveis de ativação muscular a contração das fibras produz oclusão momentânea de vasos sanguíneos, impedindo a chegada de sangue e oxigênio às fibras por eles irrigadas. Dessa maneira, após uma série de exercício resistido, a acidose localizada no músculo exercitado é importante, e durante o intervalo de descanso ocorre o seu tamponamento.



Quanto mais altas as repetições, maiores serão os graus de acidose localizada, e a consequente sensação de dor muscular em “queimação”. Isto se deve à utilização crescente da via metabólica anaeróbia glicolítica, na medida em que ocorre a depleção dos estoques de creatina muscular.

Repetições mais baixas dependem mais do metabolismo anaeróbio aláctico, produzindo menores níveis de acidose. Os exercícios contínuos realizados com intensidades elevadas também utilizam a via metabólica anaeróbia para a produção de energia, porém em associação com a via aeróbia.

Volume e intensidade são parâmetros básicos do treinamento físico que devem ser bem compreendidos. O conceito de “volume” é a qualidade de exercícios em um dado período de tempo. No treinamento resistido a especificação do volume deve indicar quantas séries serão realizadas por exercício, quantos exercícios por grupo muscular, quantas sessões por semana, e qual a frequência semanal de treinamento para cada grupo muscular, visto que sessões diárias podem ser designadas para ativar diferentes grupos musculares.

Um conceito útil para “intensidade” de um exercício é o grau de repercussões fisiológicas produzido pelo esforço. A intensidade é proporcional à potência do exercício, que vem a ser a quantidade de energia despendida na unidade de tempo. Enquanto a potência é uma grandeza física, a intensidade é uma variável biológica. Um esforço de potência elevada pode ter poucas repercussões na homeostase de uma pessoa bem treinada, enquanto que atividades de baixa potência podem ser de alta intensidade para pessoas debilitadas.

Nesse caso encontraremos acidose importante, grandes elevações da frequência cardíaca, da frequência respiratória, e da pressão arterial. Assim sendo, um determinado esforço pode ser de alta intensidade para uma pessoa, e de baixa intensidade para outra.

Em um exercício resistido a potência será tanto maior quanto maior for a carga utilizada, e quanto maior for a velocidade dos movimentos. No entanto, na maioria das vezes, a velocidade dos movimentos nos exercícios resistidos deve ser padronizada, visando a ativação muscular ideal: movimentos um pouco mais acelerados na contração concêntrica, e um pouco mais lentos na contração excêntrica. Dessa maneira, na maioria das vezes, nos exercícios resistidos a potência é dada pela carga utilizada.



Além da potência, contribui para a intensidade de um exercício resistido o grau de esforço com que é realizado. O grau de esforço “sub‑máximo” em um exercício resistido ocorre quando as repetições são interrompidas ao surgir a sensação de elevada dificuldade, correspondente ao grau “15” na escala subjetiva de esforço de Borg. Caso as repetições fossem continuadas até a falência total dos músculos, o que permitiria cerca de duas repetições a mais, o grau de esforço seria “máximo”, correspondendo ao grau “20” na escala de Borg.

O esforço máximo tem maiores repercussões fisiológicas do que o esforço sub‑máximo e, portanto, a intensidade é maior. A chamada “contração muscular máxima” é a que ocorre na última repetição em um exercício resistido com esforço máximo. A sua velocidade é baixa, aproximando‑se da isometria, e realizada com apnéia prolongada.

Habitualmente os esforços máximos são evitados em exercícios resistidos terapêuticos ou para pessoas debilitadas, com o objetivo de diminuir as sobrecargas cardiovasculares. Embora a contração muscular máxima seja utilizada com frequência em treinamento esportivo, existem muitos exemplos de atletas de nível internacional em musculação que utilizam apenas esforços sub‑máximos.

Uma pessoa forte pode utilizar grandes pesos em seus exercícios e, no entanto, caso interrompa a série antes da falência total dos músculos, estará realizando esforços com intensidade apenas moderada. Com cargas leves, os exercícios resistidos podem ter intensidades muito baixas, e podem ser classificados como “suaves”.

Um parâmetro que influi na intensidade de uma sessão de treinamento resistido é a duração dos intervalos de descanso entre as séries. Uma sessão com intervalos de descanso abaixo de um minuto reduz ao mínimo o tempo em que ocorre o gasto energético, e é dita de alta intensidade, com maiores repercussões fisiológicas.

Ao contrário, uma sessão com intervalos de descanso entre séries maiores do que dois minutos tem intensidade menor, com menores alterações de frequência cardíaca e de pressão arterial.

Intensidades altas de treinamento, caracterizadas por esforços máximos e intervalos curtos para descanso entre séries, não são utilizadas em exercícios resistidos para pessoas com saúde comprometida.

O conceito de “sobrecarga” é aumento de função dos órgãos e sistemas. A sobrecarga é a base do treinamento físico porque o organismo se adapta em forma e função às sobrecargas que lhes são impostas. Movimentos sem sobrecargas são inúteis como exercício, porque não produzem adaptações orgânicas.

- As sobrecargas musculoesqueléticas dos exercícios físicos são, basicamente, a tensão, a compressão, a tração, a torção, e a repetição dos movimentos.

- A sobrecarga metabólica é a produção aumentada de energia, com seus estímulos hormonais e imunológicos.

- As sobrecargas cardiovasculares são devidas ao aumento do volume sanguíneo circulante, e ao aumento da resistência periférica para a impulsão do sangue.

- A sobrecarga de volume é medida pela frequência cardíaca.

- E a sobrecarga de pressão é medida pela pressão arterial.

Uma medida da sobrecarga cardiovascular total é dada pelo duplo‑produto: frequência cardíaca x pressão arterial sistólica, no momento do esforço.

Exercícios intensos têm grandes sobrecargas e exercícios suaves têm pequenas sobrecargas. Nos exercícios resistidos as sobrecargas podem ser grandes ou pequenas, dependendo da forma como são realizados.

Deslocar o corpo com as pernas é uma atividade física que pode ser intensa ou suave, recebendo os nomes de corrida ou caminhada, respectivamente. Algum conflito de comunicação pode ocorrer porque nos exercícios resistidos não temos nomes diferentes para a atividade realizada de forma intensa ou suave.

Uma qualidade importante dos exercícios resistidos é o controle adequado e fácil das sobrecargas, o que permite adaptabilidade para as mais variadas condições de saúde e aptidão. Muitas pessoas não conseguem levantar‑se da posição sentada ou caminhar, porque o peso corporal é excessivo para as suas condições físicas. Essas pessoas conseguem realizar confortavelmente exercícios resistidos, com pesos adequados, menores do que o peso do corpo.

Pessoas que apresentam dispnéia, arritmias ou angina em esforços suaves como caminhar, conseguem realizar exercícios resistidos adequados com conforto e segurança.